quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Adeus à Yanonge


   Encontro-me actualmente em Yanonge, mas estou de partida. Vim cá para levara as minhas coisas, introduzir o colega que vem ocupar o meu lugar e despedir-me das pessoas. A coisa mais difícil para um missionário é dizer adeus às pessoas onde trabalhou. Antes de partir gostaria de falar um pouco desta aldeia que já foi um grande centro.
  Yanonge é uma grande localidade a 70 km da grande cidade de Kisangani, na Província Oriental da República Democrática do Congo. Este foi, desde os tempos idos, um centro de troca onde se encontravam os agricultores e os comerciantes. A proximidade do grande centro, a cidade de Kisangani, facilitava o escoamento dos produtos agrícolas e a obtenção dos produtos manufacturados.
   A partir do século X IX, vieram, do Este africano, os comerciantes árabes que se instalaram-me nesta região. Dedicaram-se ao cultivo do arroz, milho, algodão e ao tráfico de escravos.
   Em 1877, na sua viagem através da África, passou por aqui o famoso jornalista e explorador americano de origem inglese, Henri Norton Stanley. Pouco depois começou a colonização belga. As autoridades belgas declaram uma guerra total contra os traficantes de escravos que durou até 1 894.
   Em 1897 chegaram os primeiros missionários que se ficaram em Kisangani. Este centro foi o primeiro a ser evangelizado e em 1902, missionários fixaram residência aqui e fundaram a paróquia de Yanonge, dedicada ao Sagrado Coração de Jesus.
   Nos decénios seguintes, a presença dos missionários atraiu muitos comerciantes europeus, entre os quais muitos portugueses. Eles deixaram uma capelinha a nossa Senhora de Fátima.
   Nos anos 40 do século passado, Yanonge conheceu um grande desenvolvimento. Foi então que se construíram a missão propriamente dita: os conventos dos missionários e das missionárias, as escolas primária e secundária, uma escola com internato para as raparigas e um hospital. Além disso foram construídas casas para os professores e enfermeiros que vinham de longe.  
   Por seu lado os comerciantes construíram casas para viverem e armazéns. Houve um grande investimento de sociedades internacionais. Foi construída uma grande refinaria de açúcar. Mas o grande investimento foi na produção de borracha. Plantaram-se dezenas de km quadrados de árvores-da-borracha. Havia várias fábricas para tratamento e exportação destes produtos.
  Quando chegou a independência, em 1960, Yanonge era quase uma pequena cidade rica e próspera. Tinha um porto fluvial e era servida por boas estradas. As pessoas tinham um elevado nível de vida.
   Em 1964, com a rebelião Simba, os missionários foram assassinados, os comerciantes dispersaram-se e Yanonge foi esquecida. As indústrias ainda resistiram alguns anos, mas devido à situação catastrófica do país acabaram por fechar.
   Hoje, 50 anos depois da independência do país, Yanonge é uma pequena aldeia isolada. Não há estradas, o porto fluvial foi destruído e as grandes construções estão em ruínas.
   Foi neste local que trabalhei três anos. Foi um trabalho bonito, no meio de gente pobre, mas acolhedora e simpática. Na hora da partida deixo parte do meu coração no meio deste povo. Eu parto, mas continuo a partilhar com eles a grande esperança de ver um dia Yanonge resplender da grandeza passada. Para isso só precisamos de um país bem organizado onde reine a paz e a justiça.

Yanonge, 28 de Outubro de 2010

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