A capela de Guludi
Uma viagem de 70 km a pé para visitar um grupo de
cristãos
Guludi, uma das 50
comunidades cristãs da nossa paróquia, fica a 40 km de mota e a 35 km a pé. É
uma viagem que requer uma boa condição física. Por isso, um mês antes, começo
um programa intenso de preparação física com os jovens. Dirijo os treinos antes
dos encontros de futebol e, enquanto eles jogam, eu continuo a correu à volta
do campo.
Infelizmente, uma
semana antes da viagem, magoei-me numa perna, no terreno de jogo. Além disso, o
médico de Bondo, a 150 km, de passagem pela missão, descobriu-me uma “febre
tifóide” e deu-me uma cura de antibióticos, que me debilitava o organismo.
No dia da partida
tinha melhorado muito. A primeira etapa foi um passeio de 40 km de mota.
Cheguei à tarde e celebrei a missa com os cristãos desta grande capela.
O catequista que
iria acompanhar-me tinha a irmã muito doente. Fui visitar a senhora que de
facto estava em fim de vida. Rezamos e administrei-lhe o sacramento dos
doentes.
Apesar da situação
muito grave da irmã, o catequista decidiu partir comigo dizendo “Não posso
deixar o trabalho que Deus me deu”. Formávamos uma boa equipa, eu ainda meio
coxo e ele desesperado com a doença e possível morte da irmã!
À noite, o jantar
que me serviram era abundante e saboroso! Tive pena do meu colega de viagem,
era magro, pálido e tinha uma cara de fome, convidei-o a jantar comigo. Tive o
cuidado de dizer-lhe que era necessário deixar um pouco para o nosso
pequeno-almoço do dia seguinte. Mas ele tinha outras contas a fazer, pois
aquela era a primeira refeição do dia e, portanto comeu com apetite! Chegou
outro catequista, também ele com fomes atrasadas! Conclusão, o que era muito
para mim, foi pouco para quem tinha muita fome! E o pequeno-almoço do dia
seguinte foi comido no jantar daquele dia!
O programa era
claro. Partida às 5.30. Fazer uma primeira etapa de 20 km. Parar para celebrar
a Missa e depois continuar por mais 15 km até Guludi. Levantei-me cedo e
esperei pelo catequista que só chegou perto do 7.00 horas! Partimos com uma
mochila.
Os primeiros 10 km
caminhei com precaução para não despertar a entorse do pé. Depois, foi caminhar
e puxar pelo corpo até ao limite. Aos 15 km encontramos um jovem que vendia
ananás e sumo de palma (mais ou menos como o mosto de uva). Cada um tomou um
copo de deste mosto denso e açucarado, dividimos o ananás delicioso e suculento
e continuámos estrada, saboreando o nosso pequeno-almoço num ambiente de sonho!
Antes do meio-dia
chegamos à capela, onde estava prevista a celebração da Eucaristia. Os cristãos
esperavam-nos no meio de muita alegria e certa incredulidade. Enquanto
descansava, fizemos um conselho de capela (notícias da capela, dificuldades
encontradas). Depois da missa almoçamos e continuamos caminho, eram as 14.30
horas e tínhamos ainda três horas de marcha forçada para completar os 15 km de
floresta e savana. Chegamos às 17.30 horas, pouco antes do anoitecer.
À entrada da aldeia
havia um grupo de crianças que nos esperavam. Um deles precipitou-se,
abraçou-me, apanhou a minha mochila e correu levar a boa notícia da nossa
chegada. Pouco depois ouvimos o som do tambor que anunciava a chega do
missionário.
Foi uma recepção
comovente – todos queriam cumprimentar-me, abraçar, desejar as boas vindas. Um
senhor cego, que se deu conta da nossa passagem, veio apressado e quase bateu
num tronco de árvore, antes de ser ajudado.
Ali ficamos sábado e domingo. A Eucaristia do
domingo foi uma grande festa, pois há um ano que não tinham missa.
Na segunda-feira,
bem cedo retomamos o caminho do regresso, mais 35 km! O catequista amanheceu
com uma grande dor de cabeça, no centro de saúde local não havia nem uma
aspirina! Por sorte eu tinha algumas aspirinas e, o mais importante, uma cura
anti-malária. Ele tomou tudo e partimos.
A meio caminho
dei-me conta que eu tinha uma bolha da água num pé. Tentei resolver o problema
com um pouco de algodão, não deu resultado. Ignorei-a e a dor era suportável.
Paramos, ainda,
para rezar numa capela a 10 km da nossa meta. Foi um momento de repouso e de
restaurar forças com um bom almoço. Os últimos quilómetros foram muito difíceis
para o catequista abatido pela malária. Ele queixava-se “não posso mais!” Eu,
que ia à frete e comandava a caminhada, encorajava-o e mantinha a passada larga
e rápida. Parar seria fatal. O corpo quente suporta melhor a dor.
Finalmente chegamos
onde tínhamos deixado a mota. Ele tinha chegado à casa e tinha encontrado a
irmã ainda com vida. Eu tinha ainda 40 km, mas de mota, antes de chegar à minha
casa. Durante a estrada fui presenteado com uma grande chuva, coisa rara nesta época.
Uma pequena árvore caída na estrada atrasou-me ainda mais.
Cansado ao extremo,
molhado até bem dentro, mas feliz, cheguei á casa ajudado pelos faróis da mota.
No dia seguinte, a
bolha de água tinha-se tornado numa pequena infecção que me impedia de caminhar
normalmente, mas não impedia a actividade normal do dia-a-dia!
Bambilo
(Bondo), R. D. Congo 30 de Janeiro de 2014