terça-feira, 12 de abril de 2011

Maboma

Falemos um pouco de Maboma, o meu novo campo de apostolado.
Esta é umas paróquias que podemos considerar pequena comparada com as da redondeza.
Tem 25 capelas espalhadas num raio de cerca de 30 km.
Os missionários dos Coração de Jesus, ou Dehonianos, começaram, aqui, uma pequena capela no longínquo 1936. Com o tempo, conseguiram do estado uma grande extensão de terreno que foi desbravado e tornado numa enorme plantação de café. Na altura o Zaire era um dos maiores exportadores de café. Além disso, esta é uma zona privilegiada para a cultura do café. Naquela altura, havia dezenas de plantações exploradas sobretudo pelos portugueses e gregos. Hoje, nem uma resistiu, a floresta, orgulhosa e verdejante, recuperou a seu terreno.
A grande riqueza conseguida com a venda das fartas colheitas de café, foi empregue para uma enorme e bonita igreja. É sem dúvida uma das mais bonitas do Congo e mesmo da África. É uma enorme construção em cruz com 70 por 30 metros, construída como as catedrais góticas da Europa. A igreja dedicada a S. João Baptista, foi consagrada em 1958, seis anos depois, durante a terrível rebelião dos Simba, os missionários Dehonianos foram presos e, mais tarde assassinados. As Irmãs missionárias combonianas foram presas, transferida para uma prisão a 50 km daqui, onde se encontravam outros missionários e comerciantes europeus, também eles prisioneiros. No dia em que iam ser fuzilados, foram libertos por soldados belgas e sul-africanos que tinham vindo para proteger os estrangeiros e combater a rebelião.
Depois dessa tragédia, a paróquia ficou praticamente abandonada. Esporadicamente passava um missionário ou um padre diocesano para garantir o serviço religioso.
Os Missionários Combonianos chegaram a Maboma em 1984, mas vinham com um projecto específico - trabalhar com os pigmeus que habitam a floresta circundante. Por isso estabeleceram-se numa pequena localidade, bem no interior da floresta, a 20 km daqui, junto dos pigmeus. Naturalmente eram os missionários os responsáveis pela paróquia a e pelas capelas, mas a prioridade era evangelização dos pigmeus.
Só mais tarde, em 2000, e devido a insistência constante do bispo, os combonianos vieram para o centro de Maboma e habitam o antigo convento das irmãs, pois o convento dos missionários estava praticamente destruído.
O nosso trabalho é duplo, seguir os cristãos e evangelizar os pigmeus.
Um outro dia, falaremos dos pigmeus.

Maboma, Janeiro de 2011

A minha casa

Depois que saí de Yanonge, a minha antiga missão, para ir de férias, andei errante e “sem casa”. De facto durante estes meses habitei dezenas de casas, mas nenhuma era minha. Agora sim, cheguei e vivo na “minha casa”.
Com é a minha casa?
Antes de mais não é minha, nem dos Combonianos. Na verdade, é uma casa emprestada, ou se quisermos dada por algum tempo.
Este local, igreja, as construções, incluindo s e a casa onde vivemos, formam a Missão, pertence à diocese, à igreja local e é administrada pelo bispo diocesano.
Assim que o que “a minha casa” não me pertence.
Pois bem, conheçamos a casa. Esta é uma construção dos princípios dos anos cinquenta. Tem uma dezena de divisões. Quartos, salas, incluindo cozinha, refeitório, armazém e garagem para as motos e, naturalmente, uma capela.
Quando cá cheguei encontrei preparado um quarto exactamente no meio do edifício. Portanto na minha casa tenho o meu quarto, o meu cantinho.
Entremos e vejamos! É um quarto espaçoso de quatro por quatro metros. Como mobília há um armário e duas estantes que dividem o quarto em dois espaços distintos. O maior serve de escritório e o resto, um espaço muito pequeno, cerca de um metro e meio por quatro é o “quarto de dormir”.
 Os primeiros dias foram para organizar o quarto, arranjar uma outra pequena estante, arrumar as coisas. Enfim, foi um trabalho de personalizar um espaço anónimo até o tornar no “meu quarto” onde tenho “as minhas coisas” com uma certa ordem e organizadas à minha maneira.
Grande parte do meu tempo, quando não viajo para visitar os cristãos, é passado aqui neste quarto que serve para acolher as pessoas, fazer pequenas reuniões, programar as visitas às capelas, preparar homílias, catequeses, conferências. É também o lugar para repousar, rezar, ler e, evidentemente, para manter o contacto com os amigos. É aqui que estou a escrever este artigo para a “Missão não Congo”.
Esta é a minha casa e o meu quarto, mas não é o meu mundo. 
O meu mundo é muito mais vasto!

Maboma, Dezembro de 2010

A caminho de Maboma

Depois das férias em Portugal voltei ao Congo. Chegado a Kisangani, a capital do Província Oriental, fui cumprimentar as gentes de Yanonge, onde trabalhei os últimos três anos. Voltei a Kisangani e apanhei um pequeno avião para a cidade de Isiro. Dali teria que fazer 150 km para chegar a Maboma, a minha nova missão.
Em Isiro revi os amigos e esperei em vão que reparassem a moto de Maboma. Então decidi alugar um táxi moto. Falei com dois jovens da paróquia e acordamos o preço, 50€ por cada moto, uma para mim e outra para a minha bagagem. A partida ficou marcada para o dia seguinte, bem cedo.
A propósito, falemos um pouco dos táxis moto, um fenómeno bem congolês. Há poucos anos, os jovens desempregados começaram a transportar pessoas e mercadorias nas bicicletas e, para os que tinham mais possibilidades, em motos. Nasceram os táxis bicicleta e os táxis motos. Foi uma ideia genial que deu trabalho a milhares de jovens e ajuda enormemente as pessoas a deslocarem-se dentro da cidade. Estes “táxis “podem mesmo fazer percursos de centenas de quilómetros, é uma questão de preço.
É verdade que estes jovens, sem as mínimas noções de código da estrada, circulam na maior das desordens e complicam terrivelmente o trânsito. Infelizmente os acidentes mortais são frequentes.
No dia seguinte, depois de um bom pequeno-almoço, partimos pontuais.
À saída da cidade, encontramo-nos com o primeiro imprevisto. A polícia de trânsito estava à nossa espera! Estes jovens taxistas não têm documentos nem carta de condução. Por seu lado, os polícias, que são mal pagos pelo Estado, aproveitam estes “controlos” para conseguir um pouco de dinheiro para sobreviverem. É por isso que, apesar da hora madrugadora, os polícias já procuravam o pequeno-almoço!
 Ao escutarem as motos, um deles põe-se no meio da estrada de apito na boca e mãos abertas, como que a formar uma barragem. As duas motos aproximaram-se lentamente, para pararem uma do cada lado do polícia. Quando chegaram próximo e se preparavam para parar, desviaram-se e aceleraram repentinamente. As motos deram um valente puxão para a frente e afastaram-se velozmente do polícia espantado. Ele ainda se voltou, apitou e gesticulou, mas era demasiada tarde, as motos escaparam e ele ficou a olhar.

A viagem correu “normalmente” nestes carreiros que já foram boas estradas. A floresta está a ocupar o espaço que lhe tinha sido roubado! De facto, grande parte do trajecto é feita no meio da floresta. Circula-se por um carreiro estreito onde abundavam as poças de água, pedras, raízes de árvores e sobretudo muita lama que exigem uma perícia especial e a um jogo de equilibrismo constante.

 Frequentemente era necessário desviar-se das árvores caídas e seguir um carreiro ainda mais pequeno e perigoso no meio da floresta. Outras vezes tive que descer para empurrar as motos que se tinham afundado na lama. Por duas vezes o rapaz perdeu o controlo da moto e caímos, sem consequências graves. A cerca de 30 km de Maboma um tronco de árvore partiu o pedal do travão da moto onde eu ia. O moço não se preocupou muito. De facto, não tivemos problemas acrescido por falta de travões.
Finalmente chegamos a Maboma. O Irmão João Maria, e o Padre Paulo, dois missionários comboniano congoleses e meus novos colegas de missão, estavam à minha espera. Acolheram-me com um grande abraços e muitos sorrisos.
Estava cansado, mas feliz, tinha chegado à minha nova casa.

Maboma, 6 de Novembro de 2010